Inicie A Mudança: A Solução Do Conflito Começa Por Você

O presente artigo com o tema escolhido pode ser sugestivo em qualquer situação da vida dos indivíduos, o início de uma transformação deve começar em você para que depois, como um espelho, reflita na imagem do outro, ou seja, no processo que se busca métodos de soluções pacificas de conflitos, as mudanças iniciam-se primeiramente em você que como conciliador ou mediador estando na qualidade de facilitador do diálogo, contribuirá para desconstruir a resistência entre os envolvidos.

O objetivo desse artigo é chamar a atenção dos facilitadores de diálogo para a responsabilidade que carregam consigo quando estão conduzindo determinadas sessões de conciliação ou mediação, pois muitas vezes nos deparamos com pessoas extremamente magoadas e ressentidas e que por nós devem ser recebidas com empatia e com uma conversa adequada, com coerência e conhecimento, afinal, você possivelmente estará lidando com o desgaste emocional do outro, portanto, a responsabilidade no que será dito e a forma como irá se portar é fundamental para o êxito na solução da controvérsia.

Ainda, é de suma importância que o facilitador do diálogo saiba distinguir a conciliação da mediação, pois embora o objetivo seja o mesmo, qual seja a solução pacifica do conflito, as técnicas que envolvem a abordagem junto as partes se diferem e não devem ser confundidas.

Com a vigência da Lei 13.105/2015 os métodos de solução pacifica de conflito ganharam mais espaço no nosso ordenamento jurídico, observe-se que quando o Diploma Processual Civil foi reformulado houve uma preocupação do Legislador em dar notoriedade ao assunto logo no início do caderno das normas fundamentais do Processo Civil, vejamos:

Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.

§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.

§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.

§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. (BRASIL, 2015, [s.p.]).

Ainda, ficou estabelecido que os métodos de autocomposição seriam etapas obrigatórias nas fases processuais, sendo que a partir do artigo 165 do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015), os Conciliadores e Mediadores Judiciais ganharam uma sessão inteira de destaque, ficando nítido o avanço alternativo criado para tentar aliviar o grande número de demandas judicias que foram aumentando exponencialmente ano a ano, afinal não é novidade para ninguém que o número de processos que os Magistrados do Brasil muitas vezes possuem em seus gabinetes acabam por comprometer os princípios constitucionais da razoável duração do processo e a celeridade da tramitação processual.

Seguindo dentro do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015), destaco o Capitulo V (artigo 334 e seguintes) que trata das audiências de conciliação ou de mediação, e nesse ponto é imprescindível que se saiba a diferença entre essas modalidades de autocomposição, eu por exemplo, entendo que a mediação deve ser reservada para aqueles casos de relevante lide sociológica, complexos, com várias peculiaridades e que levará um tempo muito maior de diálogo junto aos envolvidos, pois as vezes é preciso até mais de uma sessão para que as pessoas possam assimilar com qualidade tudo que foi trabalhado, sentindo-se seguras o suficiente para sozinhas chegarem na solução do melhor caminho a ser seguido.

Já a conciliação se difere da mediação por muitas vezes o contato ser mais breve, isso em razão de que o facilitador do diálogo possui autonomia para participar ativamente daquilo que lhe é exposto como um problema, sugerindo propostas de acordo, formulando ideias junto as partes para que juntos possam chegar a um denominador comum.

É notório que os métodos de solução pacífica de conflito passaram a ter mais relevância no ordenamento jurídico para se tornarem um braço do sistema judiciário e também uma mão amiga para a sociedade, a fim de que os cidadãos sejam estimulados a se tornarem os protagonistas dos seus próprios conflitos os quais são inerentes a vida humana, para que com isso surja o fortalecimento do empoderamento social, possibilitando o pleno exercício de cidadania, o que inclusive, favorece o sistema de justiça.

Nesse contexto é possível dizer que as pessoas quando são estimuladas a resolverem os seus próprios conflitos, certamente no futuro não ficarão à mercê de decisões judiciais, não que isso seja algo pejorativo, mas com certeza é exaustivo e custoso para aqueles que esperam através do provimento judicial uma luz no fim do túnel, e, que não poucas as vezes, possuem uma expectativa de justiça que fatalmente é frustrada ou pela demora de se chegar a solução ou pelo que é imposto pela própria aplicação da lei.

Assim, evidentemente que muitas vezes a chegada consensual de um “meio termo” nas soluções do conflito é mais benéfica aos envolvidos do que a prevalência de um olhar imparcial e equidistante em um julgamento proferido pelo Estado-Juiz.

Portanto, a responsabilidade do conciliador ou mediador vai muito além das aplicações de técnicas, que frise-se não está a se menosprezar, porém o âmago da questão é que ao se tornar um facilitador do diálogo e se deparar com os mais variados tipos de conflitos, o sucesso consistirá em não menosprezar nenhuma história e nenhum ponto de vista, sendo dever do facilitador acolher todas a expectativas daquele momento e trabalhar uma a uma, aliando a escuta ativa com as técnicas de aplicação prática da conciliação e da mediação.

Abordando a escuta ativa, é imprescindível entender o seu conceito para traçar um paralelo com algumas das técnicas que devem ser abordadas nesse artigo, pois através dessa conexão entre escuta e técnica é que se demonstrará aos envolvidos o poder de clarear a exposição dos problemas e de dialogar sobre eles.

Pois bem. Entende-se por escuta ativa o momento no qual o facilitador do diálogo escutará atentamente ambas as partes, identificando as necessidades e sentimentos daquelas pessoas para que possa extrair o cerne do problema e na sequência realizar uma releitura para as próprias partes do conflito que lhe foi apresentado, feito isso, o facilitador estará ingressando na aplicação técnica do rapport, que nada mais é do que o elo estabelecido entre o conciliador/mediador e as partes envolvidas, criando de imediato uma relação de confiabilidade para prosseguir com diálogo (AZEVEDO, 2013).

É com o rapport bem concretizado e pautado na sensibilidade e credibilidade do facilitador que se trará a primeira chance de se estabelecer um ato frutífero entre as partes, entretanto, quando o diálogo não flui e as pessoas se mantem nos seus papéis inicias e resistentes um para com o outro, é o momento de lembrarmos da aplicação de inversão de papéis, a qual no primeiro momento aos olhos dos envolvidos lhes parecerá infundada, mas que em um segundo momento, se a técnica for bem trabalhada, pode trazer reflexão para os litigantes.

Reflita comigo: quando o interesse de um entra em conflito com o do outro, é muito comum que diante de um sofrimento um culpe o outro para que ambos possam permanecer na sua zona de conforto sem se preocupar se a dor ou a angústia que lhe acomete também não é a mesma que acomete o outro.

Nesse contexto, é comum muitas as vezes os envolvidos não conseguirem se colocar no lugar do outro, e é nesse momento que o facilitador do diálogo, com toda a sua perspicácia entrará em ação e irá desenhar em palavras aquela mesma situação porém invertendo-se os papéis entre as partes, ou seja,  colocando um no lugar do outro a fim de forçá-los a criar empatia pelo mesmo sentimento que lhes é comum, qual seja o da dor, ou da irritabilidade, da indignação ou até do desprestigio que um sente em relação ao outro (AZEVEDO, 2013).

E você pode estar se perguntando, ora, e de que forma coloco uma pessoa no lugar da outra? fazendo a pergunta e se fosse com o Senhor (a)? e eu lhe respondo,  até pode ser, mas então será preciso cuidar com o tom da pergunta para não quebrar a imparcialidade com que deve ser conduzida as sessões de conciliação ou mediação, porém acredito que o meio adequado é tentar através do diálogo ponderado desconstruir as verdades absolutas que cada um carrega em si e demonstrar que uma história pode ter duas versões e que não é preciso escolher uma delas, pois basta que haja uma compreensão do que está sendo contado pelo outro sob um outro olhar e perspectiva.

É complexo, mas quem disse que o ser humano é simples? por isso tem que ter uma audição atenta para escutar o outro, um tato para lidar com as peculiaridades de cada indivíduo que se sentará à sua frente, paciência com as divergências existente entre as partes e cuidado com a história que está lhe sendo confiada, afinal não se esqueça que o start é você quem dará, portanto, é fundamental adequar os momentos de aplicação das mais variadas técnicas autocompositivas, mas sobretudo, é imprescindível alinhar o uso das palavras.

Portanto, a frase “as pessoas não querem se resolver”, ocasionalmente pode não refletir uma verdade.

É salutar acreditar que todas as pessoas em conflito queiram solucionar os seus problemas, ocorre que pode acontecer daquelas pessoas não estarem preparadas a aceitar o desafio de desenvolverem um diálogo, inclusive por muitas vezes faltar maturidade para o momento, mas tal situação por si só não irá diminuir a responsabilidade do conciliador ou mediador em assumir as rédeas da sessão para desenrolar a solução do conflito, devendo trabalhar com estratégias, formulando propostas de conciliação, entendendo o momento de fala, de se posicionar ou simplesmente de se calar, pois o silêncio também pode ser considerado uma forma de escuta.

Caberá sempre ao facilitador de diálogo demonstrar o quanto envolvido e comprometido está com aquele momento que por vezes se apresenta tenso, propenso para a retomada de discussões que envolvem o passado, mas que interferem no presente e se não solucionados se projetarão de forma negativa para o futuro, dessa forma, é fundamental iniciar os trabalhos atento ao incômodo do outro.

Como dito anteriormente, o objetivo desse trabalho é conscientizar o facilitador de diálogo quanto a sua responsabilidade em protagonizar os métodos de solução pacífica de conflito, principalmente no que corresponde a conciliação e a mediação, e, dentro do contexto que foi apresentado, trazer uma reflexão a todos que atuam nessa área que visa minimizar a dor das pessoas, buscando soluções efetivas para o conflito, a fim de que possamos semear o diálogo, desenvolvendo conexões humanas, harmonizando as relações, e, consequentemente promovendo o empoderamento dos indivíduos para solucionar os seus próprios problemas com mais autonomia e eficácia.

Em sendo assim, para finalizar a minha breve reflexão sobre a importância das atividades desenvolvidas por conciliadores e mediadores, tidos como facilitadores de diálogo, eu não poderia deixar de mencionar a famosa frase conhecida por ter sido proferida por Mahatma Gandhi: “seja a mudança que você quer ver no mundo”, portanto, a solução do conflito começa por você!

REFERÊNCIAS

1. AZEVEDO, André Gomma de (Org.). Manual de Mediação Judicial, 4. ed. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2013.

2. BRASIL, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 30/07/2020.


[1] Assistente de Juiz de Direito da Vara de Família -TJPR, Bacharel em Direito pela UNICURITIBA, Especialista em Direito Constitucional pela ABDConst; Conciliadora e Mediadora formada pelo Tribunal de Justiça do Paraná- NUPEMEC e certificada pelo Conselho Nacional de Justiça (ano 2017), Mestranda em Ciências jurídicas com ênfase em métodos autocompositivos – Ambra University (ano 2020).