Entrevista: O que faz um mediador extrajudicial?
O que faz um mediador extrajudicial? Como é o cenário de mediação no Brasil hoje? Quais as oportunidades e desafios? Para entender mais sobre o papel e as nuances da mediação extrajudicial conversamos com a nossa diretora executiva de mediação. Além disso, Valéria de Sousa Pinto também é mediadora.
A Dra. Valéria é advogada, graduada pela PUCPR, pós graduada em direito contemporâneo, e diretora executiva de mediação. É mediadora certificada pelo Straus Institute for Dispute Resolution na Universidade Pepperdine (EUA), bem como pela ADR ODR International, além de diversas outras certificações nacionais e internacionais. Mediadora credenciada ao SIMI – Singapure International Mediation Institute e representante Brasil para o ADR ODR International Limited. Recebeu o prêmio Client´s Choice Lexology em 2023 e é uma das nomeadas no ranking Who´s Who Legal em mediação.
Ao longo dessa entrevista, exploraremos desde sua motivação inicial em se tornar mediadora até as tendências e desafios que permeiam essa prática no Brasil. A Dra. Valéria compartilhará sua visão sobre o que entende ser necessário para se tornar um mediador. Ainda, como funciona o procedimento de mediação e quais os tipos de conflitos que podem aproveitar as vantagens da solução mediada. Além disso, ela irá responder o que faz um mediador extrajudicial.
Arbtrato: Como você se interessou pela mediação?
Valéria de Sousa Pinto (VSP): Meu interesse pela mediação começou num momento de estagnação na carreira. Após 20 anos de advocacia tradicional, vamos chamar assim, me vi diante da insatisfação de resultados. Mesmo daqueles ditos perfeitos, do ponto de vista da vitória.
Acompanhar clientes sofrendo as consequências de decisões tardias que se tornavam vitórias vazias e inócuas sempre deixou uma sensação de frustração ao final dos processos. Diante desse cenário e num momento de pouco movimento no escritório, busquei a expertise de uma amiga especialista em direcionamento de carreira e o resultado me apontou a mediação.
Há 10 anos iniciei meus estudos e formações que permitiram aprimorar o exercício da advocacia. Além disso, dar início a uma nova atuação, a de mediadora de conflitos.
De lá para cá, foram diversas formações, nacionais e internacionais. Além da organização de eventos para propagar o conhecimento e a cultura autorresponsável pela solução de conflitos.
Arbtrato: Qual a diferença entre o mediador judicial e extrajudicial? O que faz um mediador extrajudicial?
VSP: O que faz um mediador? O mediador sempre será o terceiro imparcial, não envolvido na controvérsia, responsável por auxiliar as partes na construção da solução. Não há, precisamente, diferença entre judicial e extrajudicial, exceto pelo caminho percorrido até o profissional.
No formato aplicado atualmente pelo Judiciário, o mediador judicial é aquele designado para o atendimento do procedimento. Independente da escolha das partes ou de ser pessoa de sua confiança.
O mediador extrajudicial, em meu entendimento, é o mediador propriamente dito. Se considerarmos os princípios da autonomia e da voluntariedade, além da possibilidade de as partes escolherem uma pessoa de sua confiança para gerir a controvérsia.
Na atuação não devemos encontrar diferenças, posto que independente de judicial ou não, a postura profissional deve ser regida com a mesma cautela e os mesmos princípios norteadores do procedimento.
Arbtrato: O que precisa para ser um mediador?
VSP: De acordo com a Lei 13.140/2015, conhecida como a Lei de Mediação, qualquer pessoa maior, capaz e que tenha a confiança das partes pode ser mediador.
Todavia, como qualquer atividade, a preparação é crucial para uma atuação responsável. Imprescindível ressaltar a importância de uma conduta profissional do mediador. O que exigirá conhecimento de técnicas e princípios específicos. Além das diferentes escolas de mediação para que o melhor resultado seja alcançado.
Vale lembrar que “o melhor resultado alcançado” nem sempre significa dizer obter um acordo. Por vezes, a retomada do diálogo ou a definição dos pontos efetivamente controversos entre as partes traz resultados tão relevantes e expressivos quanto o acordo em si.
Arbtrato: Como funciona o procedimento de mediação e o que faz um mediador?
VSP: A mediação é um procedimento informal de solução de controvérsias. Onde as partes nomeiam uma pessoa de sua confiança para, de forma neutra, auxiliá-las a construir o melhor resultado para seu problema.
Gosto de enfatizar que a informalidade da mediação não pode ser confundida com falta de metodologia, forma ou técnica.
A mediação deve começar com a manifestação de vontade das partes, seja pessoalmente ou através de um procurador. Aceito o convite, seja o ato institucional, através de uma Câmara de Mediação, ou ad hoc, quando o profissional é escolhido e contratado para uma mediação específica. A assinatura de um Termo de Compromisso de mediação é aconselhável. Esse será o ponto de partida e documento norteador do procedimento.
Firmado o termo, organizada a agenda e definidas as questões a serem tratadas, o mediador, bem como os procuradores, devem preservar o procedimento enquanto ferramenta hábil de construção e desenvolvimento de possibilidades de soluções.
Identificar o momento em que o procedimento não mais serve ao seu fim pretendido também é indispensável ao mediador.
Ao fim do procedimento o Termo de Mediação deverá ser firmado para:
(i) elencar todo o pactuado, com detalhes e em termos inteligíveis para as partes, redigido, preferencialmente, pelos advogados;
(ii) encerrar o procedimento sem que se tenha obtido ajuste.
Outro ponto importante é não confundir a mediação com procedimentos terapêuticos. O pragmatismo, objetividade e agilidade devem estar em mente para que as partes não sejam exauridas em discussões infindáveis ou se percam, dissipando uma eventual evolução entre um encontro e outro.
Necessário ter em mente que a escolha pelo procedimento de mediação visa encontrar e construir soluções para controvérsias. Ainda, propiciar aos mediandos seguirem com suas vidas, seus negócios, suas relações, da forma que entenderem mais adequadas para suas realidades.
Arbtrato: Que tipo de conflito pode ser resolvido com a mediação?
VSP: Há quem afirme que qualquer tipo de conflito pode ser resolvido em mediação.
Eu tenho algumas restrições a essa afirmação. Não vou me ater à questão relativa aos direitos disponíveis ou indisponíveis. Mas a realidade prática, mais próxima da minha atuação, tanto enquanto advogada quanto mediadora.
Conflitos familiares que exigem a preservação de relações pessoais para além de divórcios e inventários litigiosos devem ser mediados em algum ponto. Nada impede que se organize o conflito entre os pontos que exigem a intervenção jurisdicional daqueles que cabem aos envolvidos solucionar.
Nos conflitos empresariais e reforço o pragmatismo e objetividade que mencionei antes. Posto que empresas e seus executivos não têm o luxo do tempo de sobra para tomada de decisões e solução de problemas. O que os faz um público alvo riquíssimo para os profissionais de mediação. Isso pela possibilidade de manterem o controle sobre o procedimento, desde sua instalação.
Os chamados conflitos recuperacionais podem ser resolvidos em menor tempo e com eficiência através de mediação. Antes ou no curso de recuperações judiciais ou extrajudiciais
Prevenção de conflitos é outro campo fértil. Empresas e escolas são locais propícios para aplicação da mediação enquanto ferramenta de prevenção. Ter profissionais treinados para identificar pontos de crise e hábeis a contorná-los antes que evoluam deveria estar no radar destes departamentos de recursos humanos e compliance.
Todavia, para todos esses e tantos outros mais, é imprescindível que tenhamos profissionais conhecedores dos procedimentos para que possam utilizar-se dele em toda sua grandiosidade. Aqui incluo, especialmente, os advogados que ainda desconhecem todas as suas possibilidades.
Arbtrato: Como é o cenário de mediação no Brasil hoje? Quais as oportunidades e desafios?
VSP: A mediação no Brasil está em fase de amadurecimento. As oportunidades são infinitas. O relatório Justiça em Números há anos reitera que somos uma das nações mais litigantes do planeta. A sociedade parece conformada com este título.
A advocacia ainda não entendeu que não é preciso deixar de advogar para aproveitar as vantagens das opções de solução de controvérsias disponíveis.
O Conselho Nacional de Justiça, o Supremo Tribunal Federal, além das cortes estaduais e os mais diversos operadores do direito propagam os benefícios das soluções encontradas através dos métodos alternativos. Hoje estão juridicamente respaldados no Brasil sem, no entanto, aplicá-las na proporção em que as enaltecem.
O cenário só não é mais auspicioso, em minha opinião, porque mediadores, advogados e sociedade ainda não caminham na mesma direção. Explico: temos centenas, quiçá milhares, de profissionais capacitados no país que se queixam do reduzido mercado de trabalho.
De outro lado, temos advogados que alegam não utilizar a mediação por não conseguirem justificar seus benefícios ou “vender o produto” aos clientes. Além da insegurança de serem substituídos em suas funções. A sociedade, por sua vez, ciente das dificuldades de o judiciário corresponder às suas expectativas e atender às suas necessidades, ainda não teve acesso aos benefícios e vantagens das opções de resolução disponíveis.
É preciso conectar esses pontos. Unir todas as personagens desse roteiro que, certamente, será um sucesso.
Arbtrato: Que conselho você daria para alguém que tem interesse em seguir a carreira de mediador?
VSP: Posso começar essa resposta com uma frase clichê. Somos mediadores desde o momento em que nosso despertador toca. Precisamos negociar com nosso inconsciente entre levantar ou ceder aos cinco minutos. Àqueles com filhos, desde que seus olhos se abrem e precisamos negociar com cada um ou mediar as disputas entre irmãos. E por aí vai.
Nesse raciocínio, digo sem medo, somos todos mediadores de carreira.
Na linha de sua pergunta, meu conselho é estudo, preparação, capacitação. Para continuar no lugar comum, primeiro porque aprimorar-se nunca é demais. E porque é fundamental para auxiliar aqueles que nos procuram para intermediarmos a construir suas soluções.
Arbtrato: Quais as tendências da mediação para os próximos anos?
VSP: Prever tendências é exercitar a futurologia e quando acreditamos em algo acabamos por ser otimistas demais, o que pode ser arriscado.
Entretanto, como a expectativa de reverter os números do relatório anual Justiça em números num curto prazo é baixa, vou ousar manter o meu entusiasmo.
Considerando a necessidade premente de termos soluções para nossos problemas em um lapso de tempo que nos permita beneficiar do resultado obtido. Vejo o avanço do uso e aplicação da mediação nas mais diversas demandas.
Eu acredito que nossa sociedade tem condições de evoluir para o modo ativo de solução de conflitos. Autorresponsabilizando-se tanto pelo problema quanto por sua decisão.
Arbtrato: Por quais motivos você recomendaria resolver um conflito através da mediação na Arbtrato?
VSP: Vivemos momentos nos quais a agilidade é fundamental.
A Arbtrato, enquanto plataforma, congrega vantagens indispensáveis à mediação: agilidade, profissionais capacitados, eficiência, sigilo e confidencialidade. Os motivos essenciais para que as partes entreguem e se entreguem ao procedimento de mediação com confiança e boa-fé para atingir os melhores resultados.
É válido dizer que a mediação se apresenta como opção eficaz para a resolução de conflitos. Uma alternativa de carreira que oferece oportunidades para profissionais de diversas áreas. Especialmente, aos profissionais do direito, um caminho a ser desbravado para atualizar e aprimorar a advocacia em qualquer dos lados da mesa que escolher sentar. Uma área promissora, bastante difundida e bem sucedida em diversos países, completa seu primeiro decanato no Brasil com excelente expectativa de crescimento e futuro para toda a sociedade brasileira.
Partindo para ação após entender o que faz um mediador extrajudicial
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